DOENÇA DO LIGAMENTO CRUZADO CRANIAL EM CÃES
Dr. Gabriel Diamante; Dr. Thales Bregadioli
O que é, onde fica e qual a função dos ligamentos cruzados?
Os ligamentos cruzados situam-se dentro do joelho do cão e do gato, assim como em nós seres humanos. O joelho normal além dos ligamentos cruzados tem os ligamentos colaterais, meniscos e capsula articular que contribuem para adequada função da articulação. Quando saudável apenas flexiona e estende além de permitir discreta rotação interna da tíbia. Na ausência de ligamentos cruzados, o joelho apresenta movimentos anormais, definidos como instabilidade. Tais movimentos “para frente e para trás” entre os ossos ocorrem e resultam em desgaste da cartilagem e lesão nos meniscos.
Existem dois ligamentos cruzados, um ligamento cruzado cranial (anterior nos humanos) e um ligamento cruzado caudal (posterior nos humanos). Recebem esse nome pois eles se cruzam dentro do joelho para realizar suas funções.
Por que o ligamento cruzado cranial se rompe?
Diferente de nós, seres humanos, que rompemos o ligamento cruzado na maioria dos casos por eventos traumáticos agudos (que causam impacto abrupto e direto no ligamento) os cães, salvo raras exceções, rompem o ligamento cruzado cranial de maneira crônica e degenerativa. O processo de degeneração das fibras do ligamento cruzado cranial canino ainda não é totalmente compreendido, o que se sabe é que ocorre a perda lenta e progressiva das fibras de colágeno até que em determinado momento, ocorra a ruptura total do ligamento já degenerado.
Na maioria das vezes, tal ruptura se dará sem a necessidade de um impacto importante, por exemplo atividades diárias normais, como saltar do sofá, caminhadas ou brincadeiras de bolinha são suficientes para ocasionar a ruptura total do ligamento. Isso ocorre quase que de forma exclusiva no ligamento cruzado cranial e a incidência sobre a população canina ultrapassa 20% segundo alguns estudos, em outras palavras 1 a cada 5 cães podem apresentar a doença durante a vida. Já em gatos a doença é muito rara.
Sabe-se que alguns fatores podem acentuar a ocorrência da doença como a obesidade, castração precoce, doenças imunomediadas e formato dos ossos que compõem o joelho. Outras doenças, como a luxação de patela podem predispor e precipitar ruptura do ligamento cruzado cranial.
Como é feito o diagnóstico?
Os pacientes que estão afetados pela doença geralmente começam a mancar de forma repentina ou podem apresentar agravamento desse sinal em um período. Alguns cães não apoiam a pata no chão e ficam com ela suspensa.
O diagnóstico das rupturas totais é clínico, por meio do exame físico do médico veterinário ortopedista onde ele detecta movimentos de translação que são anormais no joelho. Já os pacientes que têm lesão parcial no ligamento são um pouco mais desafiadores, pois não exibem esse movimento anormal no joelho de forma óbvia, e alguns exames complementares como radiografias e ultrassom articular podem ser necessários para complementar a avaliação clínica.
Qual a consequência da ruptura do ligamento cruzado na vida do seu PET?
Diferente do joelho do ser humano, que possui a superfície articular da tíbia plana, o joelho do cão e do gato possuem importante angulação da superfície articular, dessa maneira, quando o ligamento cruzado cranial se rompe, todas a vezes que o paciente apoia o peso ao chão o joelho se desloca “raspando” a cartilagem e os meniscos. Além de muita dor, leva ao quadro de osteoartrose que destrói a cartilagem aumentando a inflamação do joelho como um todo.
Qual o tratamento para essa doença?
Por se tratar de uma doença com um componente mecânico, ou seja, o paciente apresenta instabilidade no joelho; a cirurgia para estabilizar essa articulação se faz necessária. Nenhuma técnica cirúrgica descrita até o presente momento é capaz de impedir totalmente a osteoartrose de ocorrer, porém algumas apresentam melhores resultados em médio e longo prazo que outras, baseado em trabalhos científicos publicados e em nossa experiência.
Os pacientes que passam por cirurgia geralmente têm excelente melhora clínica. Entre as técnicas que apresentam melhores resultados estão as osteotomias corretivas do joelho, cada paciente deve ser avaliado individualmente por meio de radiografias ou tomografia para decidir qual o procedimento mais adequado para ele, pois alguns cães podem apresentar deformidades ósseas ou doenças concomitantes que necessitem outras abordagens em conjunto.
Entre as técnicas mais realizadas no mundo está a TPLO, está sigla em inglês significa Osteotomia de Nivelamento do Platô Tibial. Essa cirurgia consiste em reduzir a angulação da superfície articular da tíbia e assim impedir a instabilidade causada pela ausência do ligamento cruzado cranial. A técnica foi descrita em 1993 pelo professor Barclay Slocum nos EUA e se popularizou no Brasil há pouco menos de 10 anos. Variações dessa técnica ou outras osteotomias com o mesmo objetivo podem ser utilizadas para tratar a doença do ligamento cruzado a depender da avaliação do ortopedista veterinário.
É muito difícil o pós-operatório?
Essa é uma pergunta muito frequente no consultório, porém a boa notícia é que a grande maioria dos tutores que tem seus pets operados conseguem fazer muito bem os cuidados pós-cirúrgicos.
Basicamente os cuidados imediatos consistem no curativo diário até que se removam os pontos e no repouso, ou seja, reduzir a atividade física dos pacientes por um período, para que ocorra a consolidação óssea. Esse processo é acompanhado por exames radiográficos até a alta do paciente.
Obesidade é um problema que impede a cirurgia?
A obesidade traz consigo problemas mecânicos, pelo excesso de carga aplicado no joelho e problemas fisiológicos pela grande quantidade de mediadores inflamatórios no sangue. No entanto é contraindicado esperar que o paciente emagreça para realizar a cirurgia, pois o sofrimento do paciente e a deterioração do joelho nesse período seria intenso. Recomendamos a realização da cirurgia e em conjunto um tratamento para emagrecimento.